Embora seja considerado um clássico moderno da literatura, o livro O Conto da Aia (The Handmaid’s Tale), escrito por Margaret Atwood e publicado originalmente em 1985, acabou se tornando alvo de censura em algumas partes do mundo. Inclusive, em plena era digital, em que o acesso à informação parece ilimitado, é curioso e ao mesmo tempo preocupante observar que ainda existem tentativas de silenciar obras literárias.
Mas afinal, por que esse livro foi banido em algumas escolas, bibliotecas e até países inteiros? Para responder essa pergunta, é importante entender o enredo da obra, os temas que ela aborda e o impacto que causou desde seu lançamento.
O enredo polêmico do livro
No coração da história de O Conto da Aia está Offred, uma mulher que vive sob o regime autoritário da República de Gilead, um estado baseado em princípios religiosos que surgiu após a queda do governo dos Estados Unidos.
Nesse novo sistema, a liberdade foi substituída pelo controle total. Ou seja, mulheres perderam seus direitos, suas posses, e sua identidade legal. Inclusive, as poucas que ainda são férteis, como Offred, são designadas como “aias“: forçadas a engravidar para os poderosos da elite governante, já que a taxa de natalidade caiu muito.
No entanto, apesar do cenário fictício, a história se apoia em elementos reais. Afinal de contas, Atwood não inventou nenhuma mentira. Ao contrário: todas as práticas descritas no livro já ocorreram em algum momento da história da humanidade.
E é justamente essa proximidade com a realidade que faz do livro uma leitura desconfortável e, para alguns, ameaçadora.
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O que levou à proibição do livro?
Ao longo dos anos, o livro foi removido de listas escolares e de bibliotecas em diferentes estados dos Estados Unidos e até em países como Canadá, Portugal e Irã.
Em muitos casos, a justificativa girava em torno do conteúdo considerado “inapropriado” para adolescentes: linguagem forte, violência, referências sexuais e temas religiosos sensíveis.
Nos Estados Unidos, por exemplo, o cenário se intensificou principalmente em 2022, quando o país viu uma onda de proibições de livros em escolas públicas.
Aliás, o livro de Atwood esteve entre os mais proibidos, junto com outros títulos que abordam questões LGBTQ+, raciais e de gênero.
Em estados como Texas, por exemplo, a obra foi incluída em listas oficiais de materiais proibidos das escolas, sob acusações de conter “material sexual explícito”. Além disso, foi acusado também de promover “sentimento anticristão” e apresentar “ideologias que causam desconforto” aos alunos.
Já no Canadá, houve censura pontual relacionada à representação gráfica de violência e ao uso de linguagem considerada ofensiva.
Além disso, em outros países, como o Irã, a versão traduzida foi alterada para remover passagens que pudessem incentivar o ativismo feminino.
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A resposta de Margaret Atwood
Margaret Atwood nunca fugiu do debate. Pelo contrário, ela tem falado bastante a respeito da proibição sofrida por sua obra.
Em 2023, por exemplo, ela publicou um artigo na revista The Atlantic, no qual abordou diretamente a decisão do conselho escolar do Condado de Madison, na Virgínia, de proibir o livro nas bibliotecas escolares.
“Meu livro é muito menos sexualmente explícito do que a Bíblia,” disse Atwood.
Aliás, com essa frase, Atwood deixou claro que a proibição, muitas vezes, se apoia em argumentos fracos e inconsistentes. Inclusive, segundo ela, retirar o livro do acesso público com base em doutrinas religiosas vai contra a própria separação entre Igreja e Estado, princípio em que se baseia a democracia americana.
Além disso, a autora rejeitou a ideia de que sua obra seja “anticristã”. Ela explicou que o livro foi, em parte, inspirado em textos bíblicos, especialmente os do Antigo Testamento, e que seu objetivo sempre foi expor os perigos de governos autoritários que usam a fé para se esconder.
“Não escrevi contra o cristianismo, escrevi contra o totalitarismo,” concluiu ela.