O Senhor dos Anéis é, sem dúvidas, um grande sucesso da literatura de fantasia e do cinema. No entanto, com o passar das décadas, nem tudo envelheceu tão bem. Afinal de contas, embora a obra de Tolkien e suas adaptações para as telonas continuem fazendo muito sucesso, há fatos que, sob o olhar do público moderno, soam ultrapassados ou mesmo desconfortáveis.
A quase ausência de mulheres com protagonismo
Para começar, um dos pontos que mais chama a atenção é a escassez de personagens femininas com papéis de real destaque.
Embora figuras como Galadriel, Arwen e Éowyn tenham sua relevância na história, suas aparições são pontuais e, na maioria das vezes, estão ligadas ao desenvolvimento dos protagonistas masculinos.
Por exemplo, Arwen até ganha um pouco mais de espaço nas adaptações para o cinema, já que nos livros sua participação é bastante discreta. Além disso, mesmo Éowyn, que protagoniza uma cena marcante ao enfrentar o Rei Bruxo, logo em seguida acaba sendo direcionada a uma narrativa mais convencional, focada em romance e casamento.
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Representações raciais simplificadas
Outro ponto que costuma gerar debate é a forma como diferentes povos e criaturas são representados na história.
Orcs, trolls e outras figuras ligadas ao mal são, muitas vezes, retratados de maneira bastante simplificada — como se fossem ruins por natureza. Esse tipo de visão determinista, hoje em dia, levanta questionamentos, já que não combina muito com uma visão mais crítica e atual.
Além disso, algumas descrições físicas, especialmente em relação a personagens vindos do leste e do sul, trazem características que podem ser vistas com outros olhos atualmente. Mesmo que o autor não tenha tido essa intenção, certos trechos soam problemáticos quando lidos sob a perspectiva dos dias de hoje.
Um ritmo que exige paciência
Hoje em dia, muita gente espera que uma história já comece com ação ou algum tipo de conflito. Mas O Senhor dos Anéis segue um ritmo bem diferente, tanto no livro quanto em alguns momentos do filme.
Para se ter uma ideia, no primeiro filme da trilogia, Frodo demora 40 minutos só para sair do Condado. Já no livro, isso fica ainda mais evidente, pois são dezenas das páginas iniciais focadas no mesmo ambiente.
Nesse início, o autor dedica bastante espaço a descrever paisagens, canções e banquetes. Tudo isso tem seu charme e ajuda a criar um mundo rico em detalhes, mas pode parecer arrastado para quem está mais acostumado com tramas rápidas e diretas.
Personagens que acompanham, mas não atuam
Mesmo que todos os integrantes da Sociedade do Anel tenham seu valor simbólico, a verdade é que alguns deles quase não tomam decisões realmente importantes ao longo da jornada.
Merry e Pippin, por exemplo, passam boa parte da trama sendo levados de um lado para o outro, sempre guiados pelos acontecimentos ao redor. Na prática, muitas vezes eles atuam mais como testemunhas do que como personagens que realmente impulsionam a história.
E vale lembrar que leitores de hoje costumam se conectar mais com figuras que fazem escolhas próprias e influenciam o rumo dos eventos, algo que faltou para parte do elenco secundário.
Mudanças impopulares nas adaptações do cinema
Curiosamente, algumas das decisões tomadas nas adaptações para o cinema ajudam a mostrar quais partes dos livros talvez não tenham envelhecido tão bem. Um bom exemplo disso é a ausência de personagens como Tom Bombadil e Glorfindel — e isso não foi à toa.
As suas participações precisaram ser dispensadas para que a história dos três livros coubessem nos três filmes.
Acontece que hoje, na época dos streamings, as adaptações se tornaram muito mais livres para se estenderem em suas durações, possibilitando incluir personagens originais dos livros, coisa que, na época do lançamento da trilogia nos cinemas, não era possível.
Finalizações muito prolongadas
Quando o assunto é O Retorno do Rei, não é raro ouvir que o filme “parece que tem vários finais”. E quem leu os livros entende bem de onde vem essa sensação.
Depois da queda de Sauron, a história não termina — ela se estende por vários capítulos. Acompanhamos os hobbits voltando ao Condado, enfrentando novos desafios, restaurando a paz e, por fim, nos despedindo dos personagens em um ritmo mais contemplativo.
No cinema, isso se traduz em uma sequência de encerramentos que, embora emocionem os fãs, podem soar um pouco arrastadas para quem esperava um desfecho mais direto. São várias cenas que dão a impressão de que o filme está terminando… mas logo continuam.
Apesar de toda essa demora ter sua beleza, hoje em dia o público tende a preferir finais mais ágeis, que não prolonguem tanto o adeus.
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Definição muito simplificada de “bom ou mau”
Por fim, vale destacar que boa parte da narrativa gira em torno daquele embate clássico entre o bem e o mal.
Nesse cenário, Orcs, Nazgûl e o próprio Sauron são maus por natureza — e ponto final. Enquanto isso, os heróis quase sempre agem com honra e retidão. A única exceção mais evidente é Boromir, que até vacila, mas logo retoma o caminho certo.
Hoje em dia, no entanto, o público costuma se interessar mais por dilemas morais e personagens com “tons de cinza”. Afinal, figuras como anti-heróis, traidores arrependidos ou vilões com motivos mais humanos acabam deixando a trama muito mais interessante.